terça-feira, 4 de dezembro de 2012

O DEDO DE DEUS




Casa de Idosos[1]



Havia nas cercanias de Piracicaba na primeira metade do século XX uma senhora que, por motivos ignorados, não havia se casado. E os anos passando, a idade aumentando, a solidão crescendo, e sem uma viva alma que rompesse seu isolamento.
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E sua vida resumia-se a uma rotina infindável de trabalhos domésticos junto aos pais. Mas um dia chegou o momento dela sair deste ostracismo diário, e mergulhar no mundo existencial. Encontrara finalmente ela a quem pudesse se devotar, dar e doar de si, constituindo um novo lar, inteiramente seu.
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A família encarou com olhares desconfiados à modificação dia a dia da balzaquiana. Não podiam acreditar que ela, passados de seus cinquenta e tantos anos, viesse a se apaixonar por alguém, e que a recíproca fosse real.
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E foi chegado o momento em que todos, curiosos, não puderam mais ignorar os arroubos, e resolveram conhecer o pretendente. E foi uma surpresa e um choque para todos. Era moreno...
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Eles, com todos os resquícios dos costumes herdados dos ancestrais do século passado, descendentes de puros caucasianos, brancos, terem uma pessoa de outra raça dentro do lar. Costumes e hábitos diferentes... Não era aceitável... E seu serviço... Um simples trabalhador, sem profissão estabilizada, sem renda fixa, ganhando conforme produzisse... Isto constituía à óptica deles uma ofensa não só aos presentes bem como a todos os ancestrais. Teria ela duas opções oferecidas pelos seus genitores: ou deixava seu amor ou seria desterrada da família. Repetia-se a repugnante herança preconceitual, assim também como o era a perda da virgindade, o lavar a honra com sangue, o assassinato consensual. Não se tolerava ou aceitava um casamento multirracial. A todos estes tipos de fatos bania-se com agressões das mais diversas, o degredo familiar, a prisão em algum convento senão quando até mesmo com a morte.
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Mas, não cedeu ela um milímetro que fosse. Não abriria agora mão de sua felicidade, mesmo que tardia. E assim o fez.
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O casamento foi preparado rapidamente pelos nubentes. Ela tinha que estar casada antes que fosse expulsa de dentro de casa.
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A situação foi discutida com o cônjuge. Era premente tomar alguma decisão. E assim, como na calada da noite, foi marcado o casamento civil e religioso. Rapidamente. Não houve convites, não houve padrinhos, não houve nem convidados nem festa. Não houve nem a presença da família, amigos ou amigas. Apenas uma cerimônia rápida, onde o marido houve por bem providenciar o mínimo necessário para se evitar um ridículo maior. Mesmo na igreja, o padre imaginando a situação e sentindo-se como conivente em erro e pecado frente aos valores da época, houve por bem fazer da cerimônia algo extremamente rápido. E assim, como tinham entrado pela porta lateral, por aí também saíram, pois a frontal estava trancada. Na igreja, sem ornamentos, mergulhada em penumbra e silêncio quase sepulcral, umas poucas beatas assistiam a cerimônia com o horror estampado nas faces, não parando de benzer-se, da união feita à surdina e que se constituiria farto material para seus comentários maledicentes por bom tempo.
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Tomando de seus parcos bens, algumas poucas roupas, dois pares de sapato, um chinelo de sola quase furada, sequer com um tostão de dote e carregando em suas costas a maldição do pai, irmãos e todo o resto da família, lá se foi ela, feliz com o marido, partindo para uma vida nova, onde reinasse carinho, entendimento e compreensão entre os dois, livre de implicâncias e prejulgamentos.
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Morando na casa dos pais dele, em pequeno quarto no quintal, aí construíram seu nicho existencial. Ele, continuando a exercer sua profissão; ela, degredada da família, mas tendo plena aceitação no novo lar que a adotara e exercendo atividades domésticas.
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Devido à idade dos cônjuges, o filho que ambos ambicionavam nunca veio. E ficou o vazio da continuidade, do choro, das reinações de uma criança, do porvir de um herdeiro.
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O tempo corria, e o mesmo com os pais de seu marido. E houve o tempo em que o alfanje da morte tocou a ambos. Primeiro ao sogro, e não passado muito tempo, à genitora de seu marido.
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A pequena casa onde viviam teve que ser vendida para se repartir os parcos bens. E foram obrigados eles, amargurados, a deixar aquele quarto de quintal, fruto do trabalho dos dois, e irem morar em pequena casa de aluguel.
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Continuavam a ter uma vida frugal e satisfatória, apoiando-se, amando-se, não se deixando abater pelas intempéries da vida. Parecia que nada, absolutamente nada poderia romper aquele ciclo de bonança. Mas estavam eles plenamente enganados. Mais uma vez o destino os trairia, reservando aos dois a continuidade das más perspectivas, e do carrear das tragédias.
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Houve o dia que ele acordou indisposto. Negou-se a levantar para o trabalho. A dor de cabeça era lancinante. Embebeu um lenço em álcool e água aplicando-o sobre a testa, com resultado infrutífero. Tomou as medicações analgésicas habituais, mas sem nenhum resultado. Tinha que ir ao médico ver o que estava acontecendo, resolver o problema de saúde. Levantou-se para se vestir. O esforço foi a gota d’água.  A dor piorou. Como em um passe de mágica, mil estrelas fulgurantes explodiram à sua frente. Um zumbido brutal se instalou em seus ouvidos. E tudo isto foi num crescendo, cada vez maior. Já não sabia se estava em pé ou deitado. Nem onde estava, desconhecia a esposa ao seu lado, e finalmente nem mais sabia quem era. Toda sua percepção estava alterada, era como mil tintas a escorrerem juntas, produzindo os mais diferentes matizes. Assim como tudo havia começado, de súbito tudo se dissipou, a dor, o desespero daquelas sensações desconhecidas. Sumiram a luz, os sons e a consciência. Tudo desapareceu, e com eles a própria vida.
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A esposa assistia a tudo, impotente. Viu o marido reclamando. Viu quando ele sentou-se na cama, e sua tentativa infrutífera de ficar em pé. Viu sua queda, quando correu para auxiliá-lo, viu-o morto.
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Não podia acreditar no que acontecia. Seu grande amor se esvaindo de suas mãos, e ela totalmente impotente ao que ocorria. Era como tentar segurar a areia entre os dedos, mas ela escorria entre os vãos, e o vento os levava, não o sabia por que e nem para onde. Do grito lancinante em entender o ocorrido, veio o choro convulsivo. Veio o desespero em se ver sozinha, sem o companheiro, a mão amiga que se estendesse e a auxiliasse. Apenas o vento ululante se fazia presente, com ele largado em seus braços.
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Não se sabe quanto tempo permaneceu ela assim, mas foi até uma vizinha chegar, chamá-la, adentrar à casa, e ver a cena acre e ferina de uma mulher semidesnuda, com as vestes rasgadas, descabelada e desesperada a embalar um morto em seus braços.
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Aqueles dias foram um pesadelo... Os fatos vinham em onda, um atrás do outro... Ela recebendo apoio dos vizinhos... As dificuldades para o sepultamento... Fazer dívidas para pagar o que seria duvidoso de conseguir... A total ausência de qualquer familiar seu... A solidão e o ostracismo. Sentia-se como um cão sarnento, todos a rejeitando, ignorada, jogada ao léu, submetendo-se a todas intempéries do tempo.
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Não podia acreditar que Deus lhe houvesse reservado tudo aquilo para sua existência. Todos os problemas de sua infância, sua juventude. Não pudera frequentar a escola, a não ser nos primeiros anos. Os namorados aproximavam-se e desapareciam quando conheciam sua família. A conduta brutal e preconceituosa de seus pais e irmãos. A mãe, que lhe dava nenhum apoio. O casamento amaldiçoados por todos. Mas havia os dez anos de ternura e felicidade que havia existido com o marido, que constituíam a chama que mantinha suavemente aquecido seu coração...
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Agora, que estava um pouco feliz, Deus lhe mandara o anjo da morte para levar o pouco que tinha... Sentiu-se como condenada antes mesmo de ter nascido. Imaginava qual seria ainda o tamanho da cruz que teria de carregar... E por quanto tempo... Não conseguia entender o motivo de sua existência e sobrevivência nesta terra.
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Se antes devotava ódio contra quase todos, agora este se voltava também contra Deus. Se existisse, ele seria o responsável por todas estas fatalidades existenciais. Senão seria ela nada mais do que um joguete na mão do próprio diabo.
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Não tinha para onde ir. As poucas economias se esvaíram. O gás e os alimentos rarearam dentro de casa. Alguém falou em um lugar chamado de Casa dos Idosos... Uma entidade que vinha a prover para os necessitados.
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Com uma pequena bolsa na mão, uma mala surrada preenchida por seus parcos bens, arrastou seu alquebrado corpo e alma até o local para mendigar auxílio e poder conseguir sobreviver.
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Entre lágrimas, rememorou os revezes sua existência. Arranjaram uma cama para ela. Um quarto com mais mulheres. Aí seria agora seu novo lar, longe de todos que detestava.
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Quando olhava pela janela, via-se rodeada pelos verdes do jardim. Nas árvores centenárias os pássaros cantavam. Lentamente, ela foi construindo novos relacionamentos com outras albergadas. Conheceu outros homens. A vida parecia florescer de novo. A dor lentamente foi abrandando, e a sensação que restava era de um longínquo pesadelo. Mas tudo recrudescia ao ver uma mulher, toda de branco, que andava por todos os locais do Asilo. Era a mulher com roupas branca e preta, com sua pose imponente. Era a madre responsável pela administração do Lar. Quando a via, todo o ódio que nutria por aqueles que a haviam prejudicado renasciam. E voltava-se contra ela. Seria ela a possessão de Deus ou do diabo? Ela logo passou a ser a encarnação da culpa viva de seus maiores pesadelos. E sentia que o único modo de encerrar toda aquela situação seria nada mais do que elimina-la de sua frente.
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A ideia surgiu lentamente, e aos poucos foi crescendo dia a dia. Agora ela se transformara na fera que a havia mutilado e desgraçado sua existência, era realmente sua inimiga, a causa de todos seus insucessos existenciais. Teve um dia que uma visão fez entender tudo que acontecia, ela realmente não era freira, mas um demônio menor transfigurado dentro daquele hábito, pessoa bondosa e de fala mansa, e que deveria ser extinta. E isto para o bem não só dela, mas de todos. O próprio Lar se beneficiaria. Era ela a responsável pelo “chá da meia noite”, que tinha como consequência, quase todos os dias, um idoso falecido. Era ela quem os envenenava na calada da noite. Ela era o anjo negro transvestida naquela inocente pessoa. E assim quase todos os dias, tinha ela uma alma para levar ao inferno, exaltando ao querubim que ousara revoltar-se contra Deus, Lúcifer...
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Não se sabe como, mas uma arma foi introduzida nesta Casa de Idosos, indo parar na mão desta senhora. Alguns dizem que foi um parente dela, outros, algum conhecido muito íntimo que a levou. Outros dizem que ela própria a comprou, com suas parcas economias... Mas todos os fatos até aqui relatados são mera especulação, desconhecendo-se a verdade, agora perdida no tempo.
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Finalmente, ela agora poderia livrar o Lar do demônio, e o expulsando destas paragens, todos idosos teriam o merecido sossego que se fazia tão necessário e que tinham direito...
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Um dia, chamou a referida freira ao seu quarto, com uma desculpa qualquer. A porta abriu-se e a Irmã penetrou na penumbra do quarto. A senhora perguntou quem era ao ver o vulto, e identificando-a pela voz e imagem, enterrou a mão entre suas roupas. Quando ela saiu do entremeio destas, surgiu junto uma garrucha. Não teve nenhuma dúvida em estender o braço com a arma, mirar e apertar o gatilho. A explosão ocorreu, e com o clarão que se seguiu, o projétil foi lançado, indo à busca do corpo da irmã. Ela, ao sentir o impacto do projetil contra seu peito apercebeu de um som irreconhecível que se irradiava de sua garganta. A surpresa foi a sensação inicial, logo após seguida pela dor. Alguns breves segundos passaram-se antes que associasse o estampido ao clarão e à dor. Compreendeu que tinha sido atingida por um projétil de arma de fogo. Em altos brados, começou a gritar que estava a morrer...
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O som do disparo também atraiu a atenção de outras pessoas.  E elas logo correram para ver o ocorrido. Agora, com a janela aberta e o quarto devidamente iluminado, via-se a cena com maiores detalhes. A mulher descabelada, com a garrucha nas mãos, agora já sem munição, sentada na cama, com os olhos esbugalhados, gritando que tinha conseguido matar o demônio, a freira em pé, alguns metros à sua frente, com a mão recobrindo o peito, e no branco hábito, uma mancha avermelhada que se espalhava... Mas, apesar do aparente sangramento, tinha ela forças para manter-se de pé e continuar a vociferar do fato, e querer encomendar a alma a Deus...
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Depois de desarmada a agressora, as atenções voltaram-se para a madre, que ainda mantinha-se em pé, lívida.
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Uma observação mais acurada mostrou que o projétil realmente havia atingido o crucifixo pendente em seu peito, bem por baixo da imagem de Jesus Cristo (que permaneceu incólume), partindo-o em três pedaços, sendo que algumas lascas deste haviam penetrado em sua pele, provocando um pequeno sangramento, sem nenhum perigo para sua vida.
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Esta Madre posteriormente foi removida para prestar serviços em outro local, onde, mantendo sua fé e vocação continuou com sua missão cristã. Foi a fundadora da atual Fundação Irmã Ruth de Maria Camargo Sampaio-Firmacasa no bairro de Nova Aparecida, Campinas. A pequena creche que a Irmã fundou em fevereiro de 1973 com dois dormitórios, sala e cozinha com o nome de Berçário e Creche Casa Nossa Senhora para dar assistência a crianças órfãs e abandonadas, filhos de presidiários ou de pacientes psiquiátricos, atualmente atende ao respeitoso número de 160 crianças até seis anos em período integral, e em meio período, 180 dos seis aos 14 anos e 30 entre 15 a 24 anos.
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A outra pobre senhora, dentro de seus quadros delirantes, cogita-se que tenha sido transferida a um hospital psiquiátrico, desconhecendo-se seu fim.
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E disto tudo, restou para alguns que foram testemunhas ou tiveram conhecimento do fato relatado, da sensação da sorte exagerada da Irmã, e para outros, o milagre que se fazia presente graças ao Dedo de Deus, interpondo o crucifixo na trajetória do projétil e defendendo sua súdita da morte.
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[1] Caso que alguns reputam como verídico, outros referem como folclórico, principalmente quanto ao relatado na primeira parte do conto. A história dos acontecimentos com a madre é verdadeira. Os fatos foram devidamente mesclados e romanceados para dar continuidade ao escrito.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

O PODER ABSOLUTO (ODE DE SCHILLER)



Hoje enviaram-me letra e música do quarto movimento da 9ª Sinfonia de Beethoven cantada por mil pessoas. Realmente espantoso o desempenho. Mas, seja qual for o tamanho do coral, ela sempre será espantosa pela sua musicalidade, e principalmente pelo Ode de Alegria (1785), de Schiller (1759-1805).
 

Acredito que seria de importância relembrar que Schiller foi filho de cirurgião militar. Entra para academia militar, inicia e abandona o curso de Direito e adentra no de Medicina. Neste tempo tem verdadeira paixão pela literatura, como Plutarco, Shakespeare, Klopstock, Goethe, Lessing, Kant, Voltaire e Rousseau.
(Barítono)
Oh amigos, mudemos de tom!
Entoemos algo mais prazeroso
E mais alegre!

(Barítonos, quarteto e coro)
Alegre, formosa centelha divina,
Filha do Elíseo,
Ébrios de fogo entramos
Em teu santuário celeste!
Tua magia volta a unir
O que o costume rigorosamente dividiu.
Todos os homens se irmanam
Ali onde teu doce voo se detém.
Quem já conseguiu o maior tesouro
De ser o amigo de um amigo,
Quem já conquistou uma mulher amável
Rejubile-se conosco!
Sim, mesmo se alguém conquistar apenas uma alma,
Uma única em todo o mundo.
Mas aquele que falhou nisso
Que fique chorando sozinho!
Alegrias bebem todos os seres
No seio da Natureza:
Todos os bons, todos os maus,
Seguem seu rastro de rosas.
Ela nos deu beijos e vinho e
Um amigo leal até a morte;
Deu força para a vida aos mais humildes
E ao querubim que se ergue diante de Deus!

(Tenor solo e coro)
Alegremente, como seus sóis corram
Através do esplêndido espaço celeste
Se expressem, irmãos, em seus caminhos,
Alegremente como o herói diante da vitória.

(Coro)
Abracem-se milhões!
Enviem este beijo para todo o mundo!
Irmãos, além do céu estrelado
Mora um Pai Amado.
Milhões se deprimem diante Dele?
Mundo, você percebe seu Criador?
Procure-o mais acima do céu estrelado!
Sobre as estrelas onde Ele mora.


De imediato evoca-me a ideia do filme “Laranja Mecânica (A Clockwork Orange), de Stanley Kubrick (1971).

O extremo, onde o conceito de poder absoluto, em ultra violência gratuita, com o intuito de apenas a satisfação pessoal (ou sob qualquer outra justificativa) é algo inaceitável dentro da lógica e sanidade humana. A frase “o homem é o único animal racional: mata por prazer...” é o limite conceitual social do intolerável e inadmissível como grau de liberdade humana. Também o oposto, a submissão incontinente e voluptuosa é altamente impudica e libertina, carreando o mesmo sabor de asco e repugnância.

Mas o “pool” destes dois conceitos opostos, e a isto ainda acrescentado o Ode da Alegria constituem o núcleo explosivo da pluralidade humana em todos os sentidos, que na sua forma global, independente dos valores morais, sociais ou qualquer outro que se possa imaginar, levam a visão humana ao seu ponto mais independente do meio que o cerca, e intolerável, frente às condutas e decisões que possam ser assumidas neste estadio.

Quando abandonamos por alguns breves momentos a mediana da existência da conduta humana, e nos atrevemos a abrir as portas para observar estas condições particulares existenciais, começamos a nos sentir massacrados e verdadeiros párias sociais frente à impúdica ausência de limites e suas consequências. Mas de outro, a concepção de sensação de plena e total liberdade existencial, do absoluto poder sem limites, no limiar do inatingível, da satisfação contínua e ilimitada, da não fronteira a não ser aquela que eventualmente impomos a nós mesmos sem qualquer interferência, são fantasias de conquistas que podem ser saboreadas com total e indescritível prazer. E este sabor não se consegue em nenhum outro local ou modo, e sob nenhuma outra justificativa. O gosto de poder sobre a vida e morte de qualquer coisa é extremamente envolvente, e também periculoso e perigoso. É uma verdadeira ameaça a qualquer coisa, material ou imaterial que exista. Mas leva ao êxtase divinal. O bel prazer de criar ou varrer permanentemente da existência alguma coisa é o primeiro passo do êxtase do poder absoluto. E assim nos aproximamos ou de deus ou do diabo.

Todo o poder absoluto embriaga... e corrompe. Pois chega um momento que começamos a ver as coisas sob um prisma deturpado, que foge à realidade. Chega-se um momento que nós próprios criamos as verdades e realidades, plantamos os fatos e erigimos as continuidades segundo nosso sabor. Este exercício de se criar uma mundo fantasia, conquanto seja algo benéfico dentro da habilidade em se erigir, e transformar idéias em plena realidade, de outro lado pode-se tornar altamente maléfico. Este é o começo da perdição de qualquer um que se julgue acima da média. E, quanto mais avançamos nestas realidades virtuais, mais nos aproximamos dos deuses. É claro que o mero esboço de se atingir estes objetivos, por mínimos que sejam, seremos julgados como verdadeiro diabo. Nossos atos nunca poderiam ser entendidos como construtivos, positivistas, mas sempre pelo verso, onde o objetivo único é a destruição. E mesmo que assim o fossem, o ciúmes e a limitação de outros em fazer o mesmo seria o estímulo para os similares destruírem aquilo que não entendem ou foge à sua capacidade de realização.

Quando chegamos ao ponto de esboçar poder conduzir as realidades segundo nosso bel prazer, é chegado o momento de se ter a lucidez em nos afastarmos deste cálice de vinho, por mais saboroso que ele seja, e simplesmente parar. É chegado o momento do ocaso, e de encerrarmos todas as atividades, sejam elas quais forem, nos despojarmos desta capacidade e mergulharmos na simplicidade existencial. É chegado o momento em simplesmente pararmos de agir, e simplesmente sentarmo-nos à beira do rio, observando as águas passarem...






sábado, 27 de outubro de 2012

FERREOMODELISMO I



Um gostoso passatempo
Visão segmentar da maquete.

Para as pessoas que possuem restrição em locomover-se, há necessidade de atividades para não permanecer no ócio total. Escrever é uma delas, desde que possamos ir até uma biblioteca, fazer pesquisas, e disto fazer algo contrutivo. Nem sempre isto é possível, quando optamos por divagações sobre fatos passados. Algumas vezes tomamos de algumas idéias primordiais, e nos deixamos mergulhar no mundo da fantasia. É um exercício saboroso, o que relembra meus tempos de adolescência, aficionado em contos policiais e livros de bolso sobre ficção científica. Desde este tempo era um grande “devorador” das obras de Isaac Asimov, as quais releio frequentemente. Seu ápice seguramente foi “Fundação e Império”, uma trilogia (Fundação, Império, Fundação II) que se prolonga por mais de 1000 páginas.

Velho sobrado.


















Mas, há determinado momento que nos entediamos de ler e escrever. Há necessidade de um trabalho manual, que faça com que a atenção fique firmemente voltada a um ponto central, associada com habilidade manual .
E para atingir este ponto, optamos pela construção de maquetes. A escolha foi com férreomodelismo, que permite uma maior liberdade de criação, desde que não voltada a construir em escala reduzida a realidade.
Inicialmente começamos com a escala H0 (h zero) que é na graduação de 1:87[1]. Apesar da relativa facilidade em encontrar peças semi-prontas, restando apenas a montagem e o acabamento final, mostra-se ela com dificuldades pelo grande espaço ocupado para algo modestamente satisfatório.

Igreja central.
Abandonamos a escala H0 e optamos por escala N (1:160). Assim, haveria possibilidade de se montar maquete apreciável sem haver necessidade de termos espaço específico. Mas, eis que surge outra dificuldade: a pouca disponibilidade no mercado nacional de material.
Uma das formas de se contornar o problema foi de buscar na Internet modelos de papel (papercrafts). Foram feitos downloads destes, e impressos depois de fazer a modificação necessária para a escala N.
Os modelos foram impressos em papel 120, e depois envernizados para dar uma maior consistência e durabilidade ao mesmo. Em alguns modelos foram colocados lâmpadas (LED) em seu interior, fazendo com que tivessem outra apresentação.
As fotos anexas são exemplos das atividades executadas, o que consome tempo, mas dá um grande prazer.

Edifício central.


[1] Por exemplo, 1 centímetro equivale na realidade a 87 cm.