sábado, 3 de janeiro de 2009

CANTADORES DE CURURU DE PIRACICABA



O Canto de improviso que existe não só em Piracicaba, mas também por uma vasta região denominada Vale do Médio Tietê (que se estende desde as cercanias da cidade de Bom Jesus de Pirapora até a de Barra Bonita), é geralmente denominado de “cururu”. Sua origem seguramente é muito mais antiga, remontando ao hábito dos cantos religiosos executados pelos jesuítas para a catequese dos índios, durante a fase de colonização.
Independente de suas origens, o importante é o que permanece ainda dele nos dias atuais. Os seus rastros mais recentes o colocam ligado com a Festa do Divino, há mais ou menos duzentos anos atrás. Ele é uma antiga tradição, intimamente ligado à esta festa, que ainda subsiste nesta área. (cf. filmes e texto do Divino)
Há um momento indefinido em que o cururu extrapola as festas religiosas, e torna-se uma apresentação totalmente profana.
O que a tradição oral transmite é que dentro das manifestações religiosas, o cururu iniciava-se como canto religioso e depois havia uma parte profana. Esta manifestação do cururu foi utilizada para fazer brincadeiras, transmitir informações e divertir a quem assistia a manifestação.
Em fases mais remotas, deve ter sido usada como forma de diversão entre os tropeiros, que provavelmente colaboraram na disseminação deste costume. Assim, podiam ter pequenos momentos de recreação em suas andanças. E aos cantos iam anexando o habitual de cada dia, incrementando os conhecimentos e divulgando fatos que ocorriam, de uma região para outra.
Seguramente, a parte profana (mais burlesca) provavelmente foi anexada nos espetáculos circenses antigos (os circos de cavalinho), e dentro deste contexto foi criando o seu humor mordaz e satírico como alguns se expressam nas suas apresentações. Havia a necessidade de um canto repentista onde fosse criada uma sensação de disputa, cômica, para poder motivar aos espectadores.
Com a implementação dos meios de comunicação que começaram a se estabelecer, na década de 1940 com o rádio e depois na década de 1950 com a televisão, mais uma vez foi modificando sua forma de apresentação com uma forma mais sofisticada de exibição, associado com sistemas musicais mais complexos, o que o descaracterizou totalmente, e foi a origem das outras formas de músicas hoje existentes.
Ainda conseguimos observá-lo em suas formas menos desfiguradas dentro das apresentações feitas em áreas rurais, onde ainda mantém alguma originalidade.


Convidamos Abel Bueno (*1933) para fazer apresentação especial mostrando o que é cururu de origem, aquele que sempre transmite uma mensagem. Já tínhamos anteriormente sua imagem em “Cururu de Roda”, que é a primeira concepção do cururu religioso ou sagrado. Se possível, será colocado brevemente na rede.
Optou-se por mostrar como o cururu pode transmitir uma evocação religiosa. O canturião tem um sonho, quando convida antigos cururueiros, que já se foram, para retornarem e se apresentarem. As citações de Pedro Chiquito, Dito João, Lazaro Albino, André de Sousa Galvão, são nomes de canturiões falecidos. O próprio Deus faz parte da concepção artística. A expressão utilizada, “para viajar com a voz do vento, escute o ronco do trovão“ era expressão antiga usada pelo cururueiro André de Sousa (sg. Serrinha).
Dentro deste pensamento desenvolve uma história, aonde vai construindo e descrevendo a ideação sobre esta festa fantasmagórica, até seu término.
Já é uma manifestação diferente da apresentada pelo cururueiro Moacir Siqueira ao saudar o altar no início de uma apresentação.
Ambas as apresentações, tanto a de Moacir Siqueira com Milo na viola, como a de Abel Bueno com Laurindo na viola são manifestações variantes de um cururu religioso ou sagrado.


Mesmo João Mazzero (Piracicaba), Horácio Neto (Cerquilho) e Manézinho Moreira (Conchas), quando cantaram imitando antigos cantadores, não deixaram de colaborar na montagem e sedimentação de arquivo onde fossem retratadas antigas toadas de canturiões que já se foram. Claro se torna que nunca será a mesma coisa de uma gravação do original, mas a oportunidade é impar e não pode ser desperdiçada, visto que os cantores atuais conviveram com estes que já nos deixaram.

Já que estamos falando em colaboradores na manutenção do cururu, não poderia deixar de citar o nome de Oscar Francisco da Silva Bueno, o "Serrinha", filho de Nhô Serra (Sebastião da Silva Bueno) que tem se mostrado um batalhador de fibra ímpar, na luta pela manutenção das tradições populares.
O mais importante, no meu ponto de vista, é que estes e outros cururueiros, cientes das rápidas transformações por que passam estes cantos repentistas, e presumindo seu esquecimento (como já ocorreram com muitos), não poupam esforços em fixar estas manifestações mais antigas, para que não caiam total obscurantismo, bem como amanhã possa se constituir em um arquivo vivo de uma fase áurea do canto repentista.
Somente temos a agradecer a todos os elementos envolvidos neste processo de manutenção das tradições, iniciado em 2004 e somente agora estando sendo aberto aos interessados.
Há uma série de vídeos no youtube.com mostrando estas diversas formas de manifestações.