segunda-feira, 23 de agosto de 2010

DIVAGAÇÕES SOBRE O FENÔMENO HUMANO -1-



Free Counters






"A força não provém da capacidade e sim de uma vontade indomável." Gandhi







Há um motivo para iniciar o texto com uma águia e formigas. São os dois extremos típicos de comportamento, o primeiro em sua altivez única, um elemento que vive no máximo com sua companheira, e formigas do outro lado, uma sociedade altamente desenvolvida onde cada elemento executa sua função por toda a existência, do nascimento até a morte. Cabe ao homem, como ser racional, e com direito de opção a escolher as tendências que mais aprecie dentro de sua vida, cada uma com suas vantagens e desvantagens.

Tentaremos dentro desta série de divagações, a flutuar entre uma e outra situação, tanto no aspécto material como no filosófico. Não há intenção de se elogiar ou criticar fatos, situações, opções e mesmo a religiosidade de cada um. Unicamente de se criar o motivo de consciência e discussão do ser humano sob o aspécto material e sobre sua visão metafísica .



Os olhos estão marejados. O fonógrafo esgana-se, insiste em fazer-nos ouvir músicas que nossos ouvidos e mente negam-se a querer reconhecê-las, mas em nossa pele produzem calafrios enquanto vagas e distantes lembranças, esvanecidas em brumas, insistem em se fazer presentes. Falam de assuntos onde há a sensação que passamos por eles há muito tempo. Fazem-nos começar a aflorar à lembrança coisas há muito esquecidas. O corpo treme ao entrechoque destes valores, ora quando a mente tenta se fundir com elas e fazê-las vivas, ora renegá-las, fazendo com que permaneçam perdidas dentro do mais absoluto nada. Mas a curiosidade vai vencendo a nulidade e tomando forma. São sons que falam de valores morais, de hombridades, de compromissos assumidos não somente com outros, mas principalmente conosco próprio. São hinos que enaltecem valores civis, valores morais, da verdade e retidão humana, que se situam acima do próprio valor do existir, que envolvem a nós e todos os outros.


A voz rouca continua a exprimir noções onde a vida pouco ou nada significa, mas os valores absolutos que falam de uma existência nova, de liberdade, de uma comunhão total entre as metas existenciais, onde qualquer outro valor que se interponha contra ela torna-se insignificante ou nulo. Ela é como um respirar onde não tema-se fazer qualquer tipo de ruído. Respira-se fundo, e sente-se a massa gasosa passar pelo nariz e lábios, invadir os brônquios, e finalmente chegar até o fundo da alma. Ela escorre livre, sem dificuldades, lisa e uniforme. Nada detém seu fluxo. Esta sensação incute que, qualquer que seja o preço pago para chegar a este ponto sempre é muito caro, chegando mesmo até valores que seja dado o próprio sangue como remuneração.

Mas súbito, mesmo com as canções continuando em sua cascata exibicionista e demagógica, eis que brota do nada um momento de absoluta calmaria, quando o som do violão rompe todas as canções, e fazendo eco com o silêncio, suas cordas murmuram promessas de recompensas impagáveis, onde a paz e satisfação totais imperam. E, em um momento espástico, parece que a ilusão e realidade se fundem, tornando-se um novo elemento, desconhecido, que nos leva a um amplexo totalmente desconhecido, gozo sublime, total e infinito. Ele não passa nunca, e derrama sobre nosso corpo novas sensações antes escondidas e totalmente desconhecidas. Deixemos nosso corpo relaxar, e nos mesclemos com esta nova percepção, deixando com que ela nos impregne, entremeie-se por nossas carnes e ossos. Fechemos os olhos e deixemo-nos ser envolvido por ela, e de repente estaremos como que voando, apenas uma consciência flutuando, liberta da massa carnal. Estaremos observando primeiramente locais habituais, como o quarto que estamos, e deitado sobre a cadeira, nós mesmo. Depois, dependendo da habilidade e capacidade, iremos nos afastando deste ambiente, e o limite onde se ir é o imponderável. Nós somos o limite.

Nunca diga que o desconhecido existe, ele só é uma verdade se nossa mente não for capaz de interagir com as novas realidades ou elaborar fantasias, que divirjam da linha de raciocínio habitual, lógico. No momento que a mente consegue vagar isolada do corpo e do coerente por novos caminhos desconhecidos, rompida de uma forma quase que total com o que denominados de lógica habitual, estará andando em novas terras, novos mundos. Aí realmente poderemos ter a percepção e falar em como o mundo é gigantesco, senão infinito. Tudo dependerá do nosso pensamento cognitivo. E teremos certeza e convicção da colocação: o homem é imortal e infinito. E, por incrível que possa parecer, teremos a sensação intuitiva que algumas coisas não existem mais, como o espaço, o tempo. Todos estes são recursos fugazes para se enfrentar nossas realidades mundanas. Como parte de algo superior, temos o “dèjà vu” destas outras verdades. Infelizmente as necessidades do dia a dia fazem embotar a capacidade em as ver e as sentir. Mas se reservarmos um tempo diário a avaliar estes valores, conseguiremos vislumbrar estas verdades por um novo prisma.

Deus nunca faria uma criação para que simplesmente surgisse e desaparecesse depois de algum tempo, num estalar de dedos. Toda criação existe por uma finalidade, a de mostrar a capacidade que temos em a executar. Acreditamos que corpo e alma são manifestações diferentes de um mesmo objeto, o homem. Se o corpo é finito, o mesmo não acontece com a alma. Ela, desprendida de seus grilhões, quiçá irá para lugar especial até que seja o momento dela ligar-se novamente com um outro, e repetir o ciclo, Realidade ou fantasia, expectativa de um sonho de imortalidade e resquício da esperança de quinhão da eternidade, a certeza deste conhecimento não nos pertence nem nunca pertencerá.

Se os momentos de “déjà vu” muitas vezes beiram as raias da irracionalidade, tendem a mostrar sempre que o contato entre o passado e o presente se faz de uma forma incoordenada, esporádica e espástica. O mesmo acontece com o “déjà senti“ e o “déjá visité”. E por similaridade podemos até cogitar em contatos entre o presente e futuro e até mesmo entre o passado e futuro.

Cremos fielmente que somos frutos de algo que transcende o próprio homem, que temos um passado, presente e futuro, e que desta linha existencial amanhã teremos de dar conta ao nosso Criador.

sábado, 7 de agosto de 2010

VISLUMBRES DA INFÂNCIA 4








webpage counters





O MAIS PROFUNDO DOS AMORES
(Todas estas obras são de ficção e fruto de sua imaginação. Toda e qualquer eventual semelhança com fatos da vida real, passados ou presentes não passa de mera coincidência)


Há momentos que fico assustado em como as idéias voam, deslizam sobre o tempo, indo buscar fatos perdidos dentro da obscuridade existencial do ontem.
Hoje escrevia para uma pessoa que gosto demais, e relembrei-me do caso V... /Maf... Não menos que 40 anos passados já se vão desde que este fato assediou minha existência. Realmente as primeiras raízes tiveram início quando teria eu meus sete, oito anos. V... era uma garota que eu havia aprendido a ver com carinho todo especial já em minha tenra idade. Além de subir em árvores, brincar com meus amigos, falar sobre garotas, as imagens de sua casa, pequena, mas sempre bem arrumada por sua mãe, nunca me deixaram minha mente.


Não ficava ela mais do que quatro ou cinco quarteirões da minha. Uma porta dando diretamente para a rua, uma janela antiga, com vidraças em guilhotina, vidros impecavelmente limpos, onde quase sempre cortinas e sombras insistiam em ocultar seu interior. Esporadicamente podíamos vislumbrar nesta sala duas cadeiras e um canapé impecavelmente revestidos de palhinha. Alguns quadros ornavam as paredes e um espesso tapete que forrava o piso. Uma pequena casa, com paredes raramente caiadas, prensada entre uma padaria e uma casa de ferragens. Ora chegavam os odores de saborosos doces, Ora chegava o cáustico de produtos químicos.


Mas apesar disto tudo, eu não consigo me recordar delas sem ver estampado no rosto das duas os eternos sorrisos que ali habitavam. E, dentro de minha infância e juventude, chamava-me a atenção a ausência da imagem masculina dentro daquelas singelas paredes.
Aos meus catorze, quinze anos, com o aumentar dos hormônios, sentia-me muito mais atraído por ela. Tornara-se um de meus amores juvenis, senão dos muitos, o primeiro. Ao abandonar Piracicaba para dar continuidade aos estudos, nos distanciamos, perdemos aquele contato mais profundo, mas não o relacionamento esporádico.
Ele foi reatado após umas dez primaveras. Com meu retorno à velha cidade, comecei demonstrar vislumbres de meu íntimo à ela. Correspondências foram trocadas, idéias foram discutidas, e tinha eu meus sonhos que talvez o futuro viesse a reservar alguma coisa em comum para nós. Agora elas já moravam em um sobrado espaçoso, longe daqueles odores enjoativos. V... já não era mais aquela meninota, mas sim uma mulher, com valores e idéias perfeitamente definidas..





Mas nesta fase o surgiu o “moço da moto”, com sua roupa negra de couro, suas canções de Hair, falando respeito do doce amor a primeira vista e chegou conquistando seu coração, interpondo-se entre nós. Explosivamente foi tomando conta do espaço, e quando tomei consciência, vi que todo meu esforço havia sido perdido. Foi no dia que V., toda alegre, dengosa, veio correndo beijar-me, dizendo que agora sua vida estava de novo completa, pois amava perdidamente o rapaz da moto. E lá se foram meus sonhos água abaixo. Cabisbaixo no meu interior, mas negando-se a demonstrar a derrota, com sorrisos nos lábios, nada mais restou que dar os parabéns por sua escolha.



Nesta fase ainda ela falava em Maf... O significado deste nome é variado. Alguns falavam que dizia respeito a um tratamento carinhoso, outros a respeito ao seu verdadeiro nome. Seja como for, seu real significado está perdido no tempo e espaço. Todos os envolvidos há muito já deixaram definitivamente estas plagas e não sei dizer se andam pelas brumas do purgatório ou entre os fogos do inferno. Pode ser que se encontrem também entre as nuvens do céu.


Quando se ama por amor, os sentimentos são essencialmente profundos. Não há cobranças, mas aceitação e impulsão de um querer complementar mais ainda o cônjuge. Mas quando se ama comparando uma pessoa com outra, isto não é bem amor, e os fatos tomam inexoravelmente outro rumo.





E foi este quase que seguramente o último amor de V... por Maf... , fogo de palha, explosivo, mas que não se acabava nunca porque tinha toda a palha do mundão para queimar. Cada passo dado entre os dois era muito mais uma promessa de consolidação do relacionamento que um mero e especulativo motivo para eventual separação.
Esta foi a verdadeira perdição de V... Assim como se amaram com violência e possessivamente, sem limite algum para dar vazão aos seus sentimentos, também este fato constituiu a âncora para uma série de acontecimentos seqüenciais. Maf... mergulhando em seus pingões cada vez maiores, com sua ambivalência sexual oscilando entre o amor por V... e por seu amante, cada vez mais foi deixando a angústia tomar conta de sua pessoa. O amor por ela podia quebrar todos seus valores, criar novas metas existenciais, criar mundos e mais mundos, mas não conseguia fazer dela a única pessoa que amasse em sua vida.


“Queria ter o sol nas mãos para tecer com seus raios dourados uma eterna renda de luz, onde descansaria meus pensamentos tristes. E nesta infinita rede ilusória, deixaria meus olhos abertos até que cansassem de ver miríades de estrelas cintilantes repletas de longínquas e inatingíveis felicidades”.
Tinha ele a capacidade de mergulhar no improvável, e sair descrevendo as belezas existentes em todos os lados antípodas, de extrair amor do ódio, e ver e construir uma amizade na incompreensão e desprezo de outro.




Houve um momento que as coisas ficaram tão difíceis que, dentro da conturbação que enfrentava, pressão social, pressão familiar, dos amigos, a própria ambivalência, que a depressão tomou conta dele integralmente, e o escape mais fácil e simples para todo o caos foi um só. E até hoje os seus antigos amigos, aqueles mais chegados, quando esporadicamente relembram do áspero e indigesto assunto, discutem se chegou ele realmente a ouvir ou não o disparo da arma antes do projétil lhe fragmentasse o crânio.







Esta foi a separação e perda brutal para todos. Para um o cemitério, para outra o chorar pelo amor definitivamente perdido, isto sem falar nos sentimentos familiares. E foi também o começo de sua loucura. Para todos os que tentassem se aproximar dela vislumbrando um relacionamento afetivo, a eterna comparação de seus novos sentimentos com os que tinha para Maf é o que se fazia presente. Tal qual pêndulo que oscila entre um e outro lado, lento mas sempre no implacável movimento, assim também sua idéia abrochava. Tão certo como o vai e vem, a comparação acabava por preencher todo o seu ser, fazendo arvorecer todas suas dúvidas, suas insatisfações, que culminavam com o afastar de todos os que se aproximassem dela.
Lenta, mas inexoravelmente, o amor em palha pelo rapaz da moto ardeu e também faleceu na comparação.
V... depois de algum tempo, ignorando seus mais profundos sentimentos, deixando-os firmemente relegados e encarcerados em segundo plano, simplesmente preferiu se tornar a “Grande Senhora”, unindo-se pelo matrimônio a um dos filhos de um dos homens “poderosos” da cidade.
Mas, lentamente foi consumindo-se, tanto na pessoa como na união em que não era feliz. Não era de sua feitura ser a grande matriarca, ainda mais que não tinha ao seu lado a quem verdadeiramente amar. Por fim seu casamento também acabou. O marido junto com o filho, mudaram-se para terras não antes navegadas. A ela, restou ficar jogada à solidão dentro da gaiola de ouro que vivia e havia restado, sem mais ninguém ao lado que pudesse receber ou externar seu amor e carinho.


Infeliz do pobre Maf... e seu círculo vicioso. O contínuo ascendente de sua sensibilidade fez aumentar a bolha de sensações que lhe envolviam o corpo, mente e os sentimentos, e a impossibilidade de dar vazão aos pressentimentos e sensações que se acumulavam e o envolviam, foi fazendo ampliar em seu interior a bomba da incompreensão e da insatisfação, que se avolumavam com o não exato entendimento de sua compreensão e sensibilidade.
Houve um momento impossível de se conter. Queria se doar e todos davam risadas de sua pessoa, uns disfarçadamente, outros de forma totalmente petulante. Queria amar, e quanto mais tentava mostrar o quanto era profundo seu sentimento por todos e tudo, mas isto se constituía em regalo para suas cínicas amizades. Perdeu todos seus amores e suas estimas, tanto internas como externas.. O que nunca deixou de cultivar, brotar e florescer em seus relacionamentos, a que devotava o maior carinho e respeito foi o eterno e silencioso desprezo devotado por aqueles que se negavam a entendê-lo, que nada faziam para ampará-lo.
De forma cada vez mais avassaladora as indecisões, angústias e ambivalências foram tomando volume até que a espoleta detonou aquele pobre corpo e alma.
Apesar de todos os esforços para permanecer existindo, as forças foram exaurindo continuamente, as motivações se evanescendo e acabou ela pela triste decisão de encontrar-se novamente com Maf... , seu eterno e realmente único amor, para além deste mundo.